Com a repercussão de uma reportagem do Fantástico, da TV Globo, que mostrou a situação precária da Escola Estadual Rural Limoeiro Anexo, em Bujari, no interior do estado, o Tribunal de Contas do Acre (TCE-AC) determinou o afastamento cautelar do secretário estadual de Educação, Aberson Carvalho, por 30 dias. O governo do Acre informou que deve se pronunciar posteriormente.
A medida, assinada pela presidente do órgão, Dulce Benício, foi publicada no Diário Eletrônico de Contas desta terça-feira, 10, e cita a necessidade de apuração sobre a falta de estrutura na escola e suposta violação ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Ainda conforme a presidente, a medida foi tomada após um pedido do Ministério Público de Contas (MPC-AC).
A reportagem também acompanhou a visita à escola e retratou o cenário desolador da escola que funciona em uma estrutura improvisada, sem paredes, piso, água encanada, e com professora e alunos se dividindo entre as aulas e a limpeza do local.
Conforme o TCE, a decisão deve ser cumprida imediatamente e deve ser apreciada na próxima sessão ordinária do pleno, que deve ocorrer nesta quinta-feira, 12, e pode ser convertida em afastamento definitivo.
Ainda de acordo com o TCE, a representação do MPC-AC, baseada na reportagem e em visita de auditores da instituição, aponta:
Trabalho infantil irregular em contexto escolar, configurando, além de ilegalidade administrativa, potencial violação ao art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/1990), que impõe ao Estado o dever de garantir, com prioridade absoluta, a efetivação dos direitos fundamentais;
Precariedade sanitária extrema, com instalações improvisadas e insalubres, que afrontam diretamente o direito à saúde e à dignidade da pessoa humana;
Falhas gritantes de infraestrutura, capazes de comprometer a integridade física e psíquica dos estudantes e docentes da rede pública de ensino; e
repercussão pública de grande escala, impulsionada por matéria jornalística veiculada em rede nacional de televisão, o que amplia a responsabilidade institucional desta Corte de Contas quanto à resposta tempestiva e proporcional à gravidade do caso.
Ao ver o local, nem de longe a unidade se aproxima de uma escola estadual. Mas é nela que cerca de 17 alunos, divididos em dois turnos, cumprem o ano letivo. Consiste em apenas alguns pilares de madeira sob telhas, sem paredes e assoalho, no chão de barro.

Também há uma pequena cozinha, que funciona como despensa e até biblioteca. O compartimento tem bebedouro e também uma geladeira, mas, à época da visita da reportagem, estava quebrada desde outubro.
A sala improvisada é cercada por mato, e, os próprios pais de alunos precisam fazer uma limpeza para que o local não seja completamente tomado pela vegetação. Somente há cerca de um mês foi feito um banheiro. Antes, era preciso fazer as necessidades no mato. Não há água encanada, e eles contam com a doação de um vizinho.
A professora Célia Amorim se divide entre aulas simultâneas para sétimo e oitavo anos do ensino fundamental pela manhã, e nono ano do ensino fundamental e primeiro ano do ensino médio à tarde. À noite, uma outra professora dá aulas da modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA).
A professora, que costuma chegar ao local às 6h30, dorme na casa da cunhada, onde também mora uma das alunas, e fica na escola até às 17h.
Célia também é responsável por preparar os alimentos servidos na hora do lanche.
“Lavo louça, faço merenda. Os alunos, na maioria das vezes, lavam o prato que sujam, e eu lavo o restante. Vou fazer um cuscuz, temos sardinha, macarrão, arroz, feijão. É difícil [cumprir várias funções], só que eu tô me acostumando, né? O dia agora está dividido em dois turnos, mas quando eu comecei, era todo mundo junto de manhã e aí eu não conseguia dar conta”, fala.
Por ela também integrar a comunidade, a relação é de amizade com a educadora, mas os alunos reconhecem que a rotina acaba atrapalhando as aulas. Além disso, a infraestrutura precária também incomoda quem precisa da escola. Ao longo do dia, eles precisam até mudar de cadeira para escapar do sol.
“Não é nada contra aqui, porque, pelo menos, a gente tem onde fazer as coisas. Mas é muito ruim, tem muito bicho [insetos] devido ser [perto da] mata, e campo perto. Eu acho que é um pouco difícil também. Principalmente no verão [porque] os caminhões começam a passar, e como não tem nenhuma parede, nem nada, aí a poeira vem toda para nós”, relata Kaianny Jesus de Souza, estudante da unidade, enquanto lava a louça da merenda.
Fonte: G1 Acre / Foto: Victor Lebre/g1